Calma calma, vamos entender um pouco mais...

sábado, 12 de março de 2011

Grupo Operativo


A área de Recursos Humanos deve ter conhecimento e capacidade de envolvimento com a realidade que forma seu grupo de empregados, podendo agir de forma localizada ou não, na busca da otimização dos recursos que a empresa dispõe, indo de encontro à satisfação e aprimoramento de ambos. 

Para o exercício de algo tão abrangente, são muitas as ferramentas que esta área dispõe, dentre as quais, uma em especial que gostaria de compartilhar com vocês, descrito em um “case” fruto de um  trabalho acadêmico realizado no semestre passado. Trata-se do Grupo Operativo.  

No decorrer do “case” explico mais detalhadamente o que é um Grupo Operativo e, ainda que fora do contexto organizacional, será fácil traçar paralelos entre as duas realidades e como aplicar essa excelente e prazerosa ferramenta para o desenvolvimento de pessoas.


Relatório de observação em um grupo de gestantes.

Trabalho de observação realizado no posto de saúde do bairro Lomba do Pinheiro, zona leste de Porto Alegre. Grupo realiza reuniões visando derrubar os “mitos” da gestação. São mães experientes ou de primeira gestação que se reúnem para troca de experiências. As idades e condições socioeconômicas variam de 16 a 38 anos, de analfabetas a mães cursando o ensino superior, com rendas que variam de 1 a 6 salários míninos por família. O grupo reúne em média 20 “mãezinhas”, como são chamadas.
A reunião é mediada por uma agente comunitária, profissional de nível médio, capacitada pela prefeitura especialmente para este fim. Os encontros ocorrem sempre antes das consultas pré-natais, e duram cerca de 2 horas.
Esse grupo está nessa formação há pelo menos três meses, já há identificação entre seus pares e o clima é de amizade e descontração entre as mães.
Elas discutem basicamente questões relacionadas às verdades x mitos em torno da gestação. São debatidos itens como:
ü  Importância das consultas.
ü  Sintomas associados à gestação e seus cuidados. 
ü  Amamentação.
ü  Importância do carinho na barriga, para o bebê.
ü  Informações sobre o parto.
ü  Alimentação adequada, etc...
A maneira como os assuntos são abordados e transcorrem, demonstram tratar-se de um Grupo Operativo.
Uma longa tradição tem marcado a utilização de grupos na área da saúde. Na década de 1970, os grupos denominados operativos ganharam a atenção dos profissionais de saúde pelo seu grande potencial de aplicabilidade e pela sistematização que traziam para o processo grupal.

A organização de grupos como modalidade de atenção coletiva à população tem sido cada vez mais frequente nos serviços de saúde, o que se pode verificar pela participação de muitos clientes (participantes) em vários grupos nos centros de saúde. Em geral, esses grupos têm como critérios organizadores o tipo de doença, a idade e outros, no caso específico desta observação são de prevenção e ensinamentos sobre a gestação. Dentre os benefícios dessa modalidade de atendimento destacam-se: maior otimização do trabalho com a diminuição das consultas individuais, participação ativa do cliente no processo educativo e o envolvimento da equipe de profissionais com o cliente.

Os profissionais envolvidos possuem suporte técnico e teórico do Ministério da Saúde em parceria com a Secretaria de Saúde de Porto Alegre.

Foi Pichon-Riviere, psiquiatra e psicanalista radicado na Argentina, quem elaborou, na década de 1940, a teoria do grupo operativo. Ele definiu o grupo como um conjunto de pessoas, ligadas no tempo e espaço, articuladas por sua mútua representação interna, que se propunham, explícita ou implicitamente, a uma tarefa, neste caso, a discussão sobre fatores ligados à gestação, interatuando em uma rede de papéis com o estabelecimento de vínculos entre si, que apareceu nas experiências equivalentes quanto a sintomas e formas de tratamento popular desenvolvidas. Assim, a teoria dá grande importância aos vínculos sociais, que são a base para os processos de comunicação e aprendizagem, considerando que o ser humano é essencialmente um sujeito social. O grupo se põe como uma rede de relações com base em vínculos entre cada componente e todo o grupo, e vínculos interpessoais entre os participantes.

O processo de aprendizagem se dá pela troca de experiências, a mediadora tem pouco envolvimento com o trabalho, apenas direcionando a discussão. Em alguns momentos o debate fica acalorado, sempre decorrente de conflitos de opiniões geradas pela cultura popular, precisando da intervenção da mediadora, repondo a verdade por meio de conhecimentos técnicos levados de materiais teóricos e vídeos instrutivos elaborados pelo Ministério da Saúde. Existe um grande cuidado da mediadora para não parecer autoritária, e sim alguém que está ali para esclarecer os mitos.

O grupo é diversificado, sendo as com menos educação formal as mais falantes e ativas, o que curiosamente são as mais experientes, pois já estão em sua terceira, ou mais gestações.  Têm maior dificuldade de aceitar a quebras de seus paradigmas, ficando visivelmente frustradas, por exemplo, ao saber que farinha com água não reduz dores abdominais, ou que o parto com fórceps não aumenta o diâmetro do crânio do bebê. Muitos assuntos tidos como mitos, em muitas oportunidades trouxeram descontração à reunião, reforçando os laços e envolvendo as demais mães a participarem de forma ativa à discussão.

As mães de primeira gestação são muito observadoras, falam pouco e parecem temer seu futuro e, principalmente: a perda do bebê.

Uma dinâmica interessante se dá no início do encontro. As mães ao chegarem recebem fotos de bebês, são convidadas a nomeá-las e ficam com essas fotos durante sua apresentação. Descorem sobre o convite ao encontro, o que esperam, e contam um pouco de sua história de vida. Após levam a foto ao berçário, onde ficará até o término do trabalho, para então buscá-la.

O desafio é saber se conseguirão identificar a foto, e mostrar que não há o que temer após o parto, pois, após aquele primeiro contato com o bebê, uma mãe fica totalmente ligada, identificada à criança, não havendo mais dúvida sobre sua prole, desta forma ficam mais tranquilas, sabendo que não confundirão seus filhos, e que eles não serão trocados na maternidade.

Essa é uma dinâmica bastente emotiva. Muitas mães após pegarem corretamente as fotos que haviam deixado no maternal percebem que realmente houve uma ligação, e comentam sobre o medo da perda do filho. Lágrimas ocorreram com naturalidade em meio à comoção generalizada do grupo, algumas se apegam tanto, que querem levar a foto para casa.   

Essa observação mostrou a importância do trabalho em grupos, propiciando melhor interação e desenvolvimento dos pares. As trocas de experiências são fatores propulsores do debate, trazendo consigo muito desconhecimento, preconceitos e situações cotidianas. Por tratar-se de um grupo de baixa escolaridade, em sua maioria, a intervenção da mediadora foi necessária em muitos pontos para restabelecer a verdade. São estórias que as mães trazem desde suas avós, também de baixa instrução que parecem intocáveis como verdades absolutas. As mães, mesmo as mais instruídas, não se envolvem, pois acreditam no mito. Na verdade percebi que as mães, talvez pela fragilidade emocional que seu estado acarreta, perdem um pouco a identidade própria, precisam de muita informação e seu critério de avaliação fica desestabilizado. Acabam acreditando nos mitos, temem ainda mais suas consequências. E é, na mediação que elas recebem a tranquilidade que tanto anseiam, e a partir daí, elas resolvem colaborar com seu conhecimento, que por inexperiência, foi sufocado pela sua necessidade de acreditar no fantástico, ou invés de sua razão.

O compartilhamento é constante, o clima transcorre na maior parte do tempo amistoso, a identificação dos pares é facilmente percebida. A liberdade de expressão é total, parecendo um bate-papo informal entre amigas de longa data. Mesmo nos momentos de tensão, o clima logo é quebrado pela descontração de algum “conto” logo dito por outra participante. A aprendizagem efetiva, com colaboração intensificada com o decorrer da reunião. O tempo passa rápido, e logo estão as “mãezinhas” ansiosas pelo novo encontro, onde novamente poderão compartilhar seus “causos” a aprender ainda mais sobre a vida que estão gerando e principalmente, como mantê-las seguras e saudáveis.
Nessa observação ficam evidentes os benefícios que um grupo operativo propicia, criando vínculos, minimizando conflitos e facilitando o aprendizado. Qualidades altamente necessárias ao meio organizacional, sendo para ajustes ou ainda condutores comportamentais.
  

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