A área
de Recursos Humanos deve ter conhecimento e capacidade de envolvimento com a
realidade que forma seu grupo de empregados, podendo agir de forma localizada
ou não, na busca da otimização dos recursos que a empresa dispõe, indo de
encontro à satisfação e aprimoramento de ambos.
Para
o exercício de algo tão abrangente, são muitas as ferramentas que esta área
dispõe, dentre as quais, uma em especial que gostaria de compartilhar com
vocês, descrito em um “case” fruto de um trabalho acadêmico realizado no semestre
passado. Trata-se do Grupo Operativo.
No
decorrer do “case” explico mais detalhadamente o que é um Grupo Operativo e,
ainda que fora do contexto organizacional, será fácil traçar paralelos entre as
duas realidades e como aplicar essa excelente e prazerosa ferramenta para o
desenvolvimento de pessoas.
Relatório de observação em um grupo de
gestantes.
Trabalho
de observação realizado no posto de saúde do bairro Lomba do Pinheiro, zona
leste de Porto Alegre. Grupo realiza reuniões visando derrubar os “mitos” da
gestação. São mães experientes ou de primeira gestação que se reúnem para troca
de experiências. As idades e condições socioeconômicas variam de 16 a 38 anos, de
analfabetas a mães cursando o ensino superior, com rendas que variam de 1 a 6
salários míninos por família. O grupo reúne em média 20 “mãezinhas”, como são
chamadas.
A
reunião é mediada por uma agente comunitária, profissional de nível médio,
capacitada pela prefeitura especialmente para este fim. Os encontros ocorrem
sempre antes das consultas pré-natais, e duram cerca de 2 horas.
Esse
grupo está nessa formação há pelo menos três meses, já há identificação entre
seus pares e o clima é de amizade e descontração entre as mães.
Elas
discutem basicamente questões relacionadas às verdades x mitos em torno da
gestação. São debatidos itens como:
ü Importância
das consultas.
ü Sintomas
associados à gestação e seus cuidados.
ü Amamentação.
ü Importância
do carinho na barriga, para o bebê.
ü Informações
sobre o parto.
ü Alimentação
adequada, etc...
A
maneira como os assuntos são abordados e transcorrem, demonstram tratar-se de
um Grupo Operativo.
Uma longa tradição tem marcado a utilização de grupos na
área da saúde. Na década de 1970, os grupos denominados operativos ganharam a
atenção dos profissionais de saúde pelo seu grande potencial de aplicabilidade
e pela sistematização que traziam para o processo grupal.
A organização de grupos como modalidade de atenção
coletiva à população tem sido cada vez mais frequente nos serviços de saúde, o
que se pode verificar pela participação de muitos clientes (participantes) em
vários grupos nos centros de saúde. Em geral, esses grupos têm como critérios
organizadores o tipo de doença, a idade e outros, no caso específico desta
observação são de prevenção e ensinamentos sobre a gestação. Dentre os
benefícios dessa modalidade de atendimento destacam-se: maior otimização do
trabalho com a diminuição das consultas individuais, participação ativa do
cliente no processo educativo e o envolvimento da equipe de profissionais com o
cliente.
Os profissionais envolvidos possuem suporte técnico e
teórico do Ministério da Saúde em parceria com a Secretaria de Saúde de Porto
Alegre.
Foi Pichon-Riviere, psiquiatra e psicanalista radicado na
Argentina, quem elaborou, na década de 1940, a teoria do grupo operativo. Ele
definiu o grupo como um conjunto de pessoas, ligadas no tempo e espaço,
articuladas por sua mútua representação interna, que se propunham, explícita ou
implicitamente, a uma tarefa, neste caso, a discussão sobre fatores ligados à
gestação, interatuando em uma rede de papéis com o estabelecimento de vínculos entre
si, que apareceu nas experiências equivalentes quanto a sintomas e formas de
tratamento popular desenvolvidas. Assim, a teoria dá grande importância aos
vínculos sociais, que são a base para os processos de comunicação e
aprendizagem, considerando que o ser humano é essencialmente um sujeito social.
O grupo se põe como uma rede de relações com base em vínculos entre cada
componente e todo o grupo, e vínculos interpessoais entre os participantes.
O processo de aprendizagem se dá pela troca de
experiências, a mediadora tem pouco envolvimento com o trabalho, apenas
direcionando a discussão. Em alguns momentos o debate fica acalorado, sempre
decorrente de conflitos de opiniões geradas pela cultura popular, precisando da
intervenção da mediadora, repondo a verdade por meio de conhecimentos técnicos
levados de materiais teóricos e vídeos instrutivos elaborados pelo Ministério
da Saúde. Existe um grande cuidado da mediadora para não parecer autoritária, e
sim alguém que está ali para esclarecer os mitos.
O grupo é diversificado, sendo as com menos educação
formal as mais falantes e ativas, o que curiosamente são as mais experientes,
pois já estão em sua terceira, ou mais gestações. Têm maior dificuldade de aceitar a quebras de
seus paradigmas, ficando visivelmente frustradas, por exemplo, ao saber que
farinha com água não reduz dores abdominais, ou que o parto com fórceps não aumenta
o diâmetro do crânio do bebê. Muitos assuntos tidos como mitos, em muitas
oportunidades trouxeram descontração à reunião, reforçando os laços e
envolvendo as demais mães a participarem de forma ativa à discussão.
As mães de primeira gestação são muito observadoras,
falam pouco e parecem temer seu futuro e, principalmente: a perda do bebê.
Uma dinâmica interessante se dá no início do encontro. As
mães ao chegarem recebem fotos de bebês, são convidadas a nomeá-las e ficam com
essas fotos durante sua apresentação. Descorem sobre o convite ao encontro, o
que esperam, e contam um pouco de sua história de vida. Após levam a foto ao
berçário, onde ficará até o término do trabalho, para então buscá-la.
O desafio é saber se conseguirão identificar a foto, e
mostrar que não há o que temer após o parto, pois, após aquele primeiro contato
com o bebê, uma mãe fica totalmente ligada, identificada à criança, não havendo
mais dúvida sobre sua prole, desta forma ficam mais tranquilas, sabendo que não
confundirão seus filhos, e que eles não serão trocados na maternidade.
Essa é uma dinâmica bastente emotiva. Muitas mães após
pegarem corretamente as fotos que haviam deixado no maternal percebem que
realmente houve uma ligação, e comentam sobre o medo da perda do filho. Lágrimas
ocorreram com naturalidade em meio à comoção generalizada do grupo, algumas se
apegam tanto, que querem levar a foto para casa.
Essa observação mostrou a importância do trabalho em grupos,
propiciando melhor interação e desenvolvimento dos pares. As trocas de
experiências são fatores propulsores do debate, trazendo consigo muito
desconhecimento, preconceitos e situações cotidianas. Por tratar-se de um grupo
de baixa escolaridade, em sua maioria, a intervenção da mediadora foi
necessária em muitos pontos para restabelecer a verdade. São estórias que as
mães trazem desde suas avós, também de baixa instrução que parecem intocáveis
como verdades absolutas. As mães, mesmo as mais instruídas, não se envolvem,
pois acreditam no mito. Na verdade percebi que as mães, talvez pela fragilidade
emocional que seu estado acarreta, perdem um pouco a identidade própria,
precisam de muita informação e seu critério de avaliação fica desestabilizado.
Acabam acreditando nos mitos, temem ainda mais suas consequências. E é, na
mediação que elas recebem a tranquilidade que tanto anseiam, e a partir daí,
elas resolvem colaborar com seu conhecimento, que por inexperiência, foi
sufocado pela sua necessidade de acreditar no fantástico, ou invés de sua
razão.
O compartilhamento é constante, o clima transcorre na
maior parte do tempo amistoso, a identificação dos pares é facilmente
percebida. A liberdade de expressão é total, parecendo um bate-papo informal
entre amigas de longa data. Mesmo nos momentos de tensão, o clima logo é
quebrado pela descontração de algum “conto” logo dito por outra participante. A
aprendizagem efetiva, com colaboração intensificada com o decorrer da reunião.
O tempo passa rápido, e logo estão as “mãezinhas” ansiosas pelo novo encontro,
onde novamente poderão compartilhar seus “causos” a aprender ainda mais sobre a
vida que estão gerando e principalmente, como mantê-las seguras e saudáveis.
Nessa observação ficam evidentes os benefícios que um
grupo operativo propicia, criando vínculos, minimizando conflitos e facilitando
o aprendizado. Qualidades altamente necessárias ao meio organizacional, sendo
para ajustes ou ainda condutores comportamentais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário